segunda-feira, 12 de novembro de 2012

como é difícil pôr um ponto-final numa história de reticências

Hoje, ao ler a poesia de todos os dias, eu percebi que os verbos estavam conjugados em nosso tempo. Pretérito imperfeito. E a constatação do meu imperativo rondava os sujeitos omissos nas frases que costumávamos apreciar.
Era uma vez uma poeta que se apaixonou pelo poema inacabado. E o verso ficou em branco. E a rima perdeu a graça. Era uma vez um poeta que amou uma borboleta (ou teria sido uma flor?) em segredo. E seu verso emudeceu. E sua rima perdeu o controle.
Hoje, quando eu abri meu caderno para rascunhar mais uma saudade de você, eu notei a folha envelhecida. Eu amassei os pronomes contidos em nossas páginas. E tentei inverter o sentido da metáfora metendo-a dentro do vazio ocupado pelo silêncio da sua verve, com as sílabas dissonantes que você calou.
Era uma vez um verbo em Pessoa, em preciso navegar, a concordância impessoal... Era uma vez a febre e o desejo do "Corpo" drummondiano... que já fora presente. Era uma vez todo um arsenal de finais felizes mutilados... Era uma vez um enredo perfeitamente articulado ao desfecho de nossas limitadas impossibilidades textuais. A gramática de nossas línguas alterada por declinações e cenas mal pontuadas. Era uma vez um predicado incompleto. Uma vírgula separando elementos indissociáveis nas veredas daquele ser tão inexpressivo. Era uma vez uma história dentro do romance que o passado não leu...

sábado, 10 de novembro de 2012

pra você o meu melhor

Quando quero falar de você, procuro a melhor palavra, mas não sei qual o melhor momento. Para falar com você, busco sempre o melhor adjetivo, mas não sei qual a melhor construção. Quando quero encontrar você, escolho o melhor lugar, mas não sei se estou no melhor caminho. Se o assunto é você, teço a melhor trama, mas não sei se bordo a melhor cena. Sei, sim, que se é você que está em jogo, invisto minhas melhores intenções

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

enterrando os mortos (que vivem dentro de mim)

Dentro de mim, a chama das paixões até se mantém acesa. Há qualquer coisa que sustenta a combustão apesar da falta de oxigênio. Um elemento químico natural e mais escasso também. Por dentro tudo é vida, fogo, luz.
Na vida real, no entanto, do lado de fora dos meus sonhos inconscientes e inoportunos, faço um buraco, escavo meu interior solitário e descontente com a falta de sol nos dias. Não está chovendo... por fora, não. Minha chuva interna é que não cessa e oculta a luminosidade dos desejos impossíveis.
Para diminuir meu sofrimento, concentro o pensamento nos homenageados do dia. Comemoro tudo o que foi interrompido e maltrato o passado com vestígios de ironia. Saúdo os mortos. Mas apenas os que ainda não morreram. Visito o cemitério em que deixei as esperanças. Depositei tantas alegrias em terrenos movediços e áridos. Penso na possibilidade de acordar esses defuntos, almas a vadiar pelo meu mundo onírico e descontínuo de realidade.
No entanto, agora já está tudo em decomposição... paixões são inflamáveis e viram cinzas. E eu insisto em enfeitar túmulos decadentes onde apodrecem paixões inesquecíveis.