segunda-feira, 16 de setembro de 2013

ode ao tempo

Ternura
Vinicius de Moraes

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar
                                                                     [ extático da aurora.


(Texto extraído da antologia "Vinicius de Moraes - Poesia completa e prosa", Editora Nova Aguilar - Rio de Janeiro, 1998, pág. 259.)

 Hoje comemoramos três anos do primeiro beijo. Você nem sabe, mas eu conto os dias, as horas, as palavras, tudo o que vem de você. Pode parecer meio adolescente, meio bobo. Mas eu contabilizo todos os nossos bons momentos. Coleciono lembranças de nossos encontros furtivos e felizes em suas melhores intenções. Não me leve a mal... é só uma maneira de reviver sempre o que é bom e permanece, apesar das rimas perecíveis e dos instantes voláteis que permeiam nossa história. 
O que importa, hoje, é que há três anos descobri que o gosto da sua saliva tempera o sabor que minha pele exala, quando sua libido fala a mesma língua que a minha.
Eu me lembro de tudo... de cada gesto... da cor difusa dos seus olhos... da chama que seu olhar lançou sobre minhas pernas... da sua habilidade manual, a destreza... sua boca vasculhando com intimidade meus secretos fetiches...
Da leveza sutil no jeito de me tocar, com suavidade e paixão, ao fogo ardente da vela, queimando meus receios e consumindo o ar que me faltava...
Do fundo musical improvisado (eu tão romântica, transgredindo convenções, coloco  The Cranberries para rodar e embalar nossa noite) à trilha sonora escolhida a dedo em noites amenas de carinho...
Do vinho que serviu de pretexto para nossa estreia ao texto propriamente sentido...  
Mas o que importa é que hoje completamos três anos de cumplicidade e mais alguma coisa que eu ainda sei que nome tem...


quarta-feira, 11 de setembro de 2013

o nó(s) na garganta

Estou tentando há dias escrever sobre nós. Não o substantivo abstrato que fomos, quando os sonhos se amalgamavam enquanto nossos desejos se amavam. Não o complemento direto da pessoa plural que somos quando somamos nossas carências físicas e transmutamos prazer. Não o górdio - dileto assunto que omitimos da nossa inatingível comunicação.
Estou tentando escrever sobre nós. Há muito tempo.
Nós, que nunca atamos. Nós, que sempre sós.
Estou tentando escrever sobre nós: cegos. Nós desfeitos, sem amarras, sem pontas, sem laços.
Ainda há pouco li este poema e mais uma vez tentei...


"incomunicáveis

tu aqui
e eu com saudades
de ti

não do que és – do que foste
da alegria que havia
em teu rosto"

(líria porto)




sábado, 7 de setembro de 2013

sábado especial

Sábado passado, passei-o pensando em você. Passo a passo, passo por onde passei com você. Passeio pelas ruas por onde passamos juntos. Passagem obrigatória! Passo e paro na frente do bar onde você passou, pela primeira vez, a palma da mão sobre minhas coxas. Passo mal só de pensar! Um dia isso tudo será só passado e pode ser que nem eu nem você passemos por isso outra vez. Mas no sábado que passei por aqui, pensei em você... agora é tarde, já passou!

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

dobraduras & desdobramentos

Tenho tantos começos para o nosso romance, que me perco nas fantasias decorrentes do título (óbvio) que pulsa entre os dedos. Uma lista de citações colhidas nos seus escritos denuncia a dependência literal que minha imaginação tem de você. Ontem eu pensei em ignorar o início e partir para o clímax: conflitos, intrigas, tramas mirabolantes entrelaçadas: "Então, antes de fechar o caderno, eu escrevi mais uma frase do drama que quero apresentar a você." Frase sem efeito. Inútil elaborar situações artificiais para dar sentido aos escritos impulsivos que produzo para você ler.

................................................................

Imagino agora suas digitais deslizando por esta folha de papel... me sinto observada por seus olhos. Olhar à primeira lida. Eu... folheada... e o seu toque me faz mudar de sentido...
Certas habilidades são irresistivelmente sedutoras. Mãos. Você deveria saber. Certamente você sabe. Mas talvez o que não saiba, talvez não tenha noção, é que depois de acompanhar seus gestos dançando graciosamente, os dedos embaraçando movimentos sobre o papel! Depois de comprovar seu talento artístico com o papel colorido – verde: a nossa cor preferida! -, me tornei refém da sua destreza. Como já poderia ser previsto, eu que sou tão previsível não negaria o senso comum. Porque, ainda que pareça singular, sou tão comum... Queria mesmo fugir desse lugar-comum...
Mas o clichê é o que de mais original vem revelar, construir, compor esta ficção.
Eu tão sintética, sintática, tão gramaticalmente correta... não sou capaz de usar a objetividade em nenhuma oração. Acho que é por isso que prefiro os poemas. Acho que é por isso que, quando me ponho a brincar com as palavras, acabo escolhendo o poema.