domingo, 25 de agosto de 2013

prólogo

Procurando inspiração para começar a escrever aquela história, para, enfim, terminar depressa com aquela novela, foi que eu encontrei a sua narrativa. Estava lá, era um texto longo, de não-sei-quantos-mil caracteres, e incontáveis aventuras amorosas. Era tudo imperfeitamente engendrado; uma narrativa comum e sem sofisticação de estilo. Então era isso, pensei!, durante todo tempo vivemos a farsa de mais uma ficção. Trágica, dramática ou óbvia demais para os personagens que assumimos antes que a cortina se abrisse? Piegas é que não era. Você sabe manipular os substantivos com a precisão de um artesão. Você cria imagens inusitadas com as metáforas mais populares. E você seduz. Põe adjetivos doces para amenizar períodos nebulosos e desconexos. Sua linguagem atraente, palavras.
Na minha versão, os parágrafos tinham outra intenção. Eu usaria tons diversos para colorir aquelas mesmas palavras. Mas quem começou a discorrer sobre nós foi você; e por isso essas orações me pareciam fora de contexto.
Levei certo tempo para me acostumar com seu jeito desinteressadamente carinhoso. Demorei para "entender" aqueles sinais sutis e distorcidos de admiração. Mas você foi tecendo as páginas, encorpando o enredo... e quando eu menos esperava, você pôs o verbo na entrelinha que eu mantinha incompleta! 
Assim, sem muito critério sintático mesmo! Você simplesmente me fez objeto indireto daquele verbo intransitivo. E eu, que tenho por princípio fazer só o meu trabalho de revisão, me senti tão sem função naquela frase! Sugeri até que você revisse, que excluísse ou trocasse o sujeito. Eu queria que você fosse o sujeito. Queria que você não usasse tantas reticências ao me conjugar com seus defeitos. Eu queria... 
Mas o romance está no final, já desfilaram naquelas linhas, naquelas páginas, todas as idiossincrasias a que um amador  tem direito. 
(Pensei agora como é bom escrever poemas... a licença poética nos livra dessas armadilhas!)


“Y debo decir que confío plenamente en la casualidad de haberte conocido. Que nunca intentaré olvidarte, y que si lo hiciera, no lo conseguiría. Que me encanta mirarte y que te hago mío con solo verte de lejos. Que adoro tus lunares y tu pecho me parece el paraíso. Que no fuiste el amor de mi vida, ni de mis días, ni de mi momento. Pero que te quise, y que te quiero, aunque estemos destinados a no ser.”
(julio cortázar)

sábado, 24 de agosto de 2013

tsunamis e intempéries

De repente nada mais faz sentido. Meus sentidos não obedecem ao reflexo natural das articulações. Tudo é transitoriamente tempestivo e incerto. Sempre foi assim, na verdade. Nunca houve tempos de paz e tranquilidade quando o pensamento estava povoado por lembranças suas. Mas agora que essa onda gigantesca de realidade me atingiu e varreu sonhos tão entranhados nos meus dias... agora, que a áspera e trágica transparência agride minhas pupilas com letras fosforescentes e nenhuma poesia traz o tom apaziguador (nada apazígua a dor)... agora eu posso me sentir em perfeito estado de torpor.
Há uma imensidão de abismos engolindo meus planos... planos simples e plenos de cumplicidade! Planos que agora não encontram um lugar comum em nossa lista de interesses.
Uma inadequação lógica sem precedentes na história da matemática clássica ou da física quântica. A multiplicação constante de dores interiores e intransponíveis. O que escrever agora? Como acrescentar brilho ao enredo do romance natimorto? Nas entrelinhas só uma tristeza e a completa falta de argumentos ... Totalmente fora de contexto, eu tento, teço mais um capítulo: o final, última e única possibilidade para a continuidade do que parecia tão vasto de intenções...

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

entre silêncios e declarações

Eu queria que a nossa história tivesse outro fim. Que não tivesse fim. Só esse meio bonito e aconchegante entre as nuvens. Só esse email (o primeiro que você me mandou!) poeticamente instigante e repara-dor. Eu esperava encerrar esse romance com uma promessa de sucesso. Eu rascunhei um best-seller!! Eu escrevi cada capítulo me (ins)pirando nos parágrafos que iniciávamos a cada beijo. Eu me iludi com as frases que você postava sobre mim quando deitava e deixava o verbo latejar... reverberar... E eu pensava que poderia compor um grande campeão de vendas com a nossa história. Mas agora a prosa perdeu o prazer de viver. As conjugações conjugam sujeitos outros. Eu imaginei tantos começos pro nosso romance! Pura ingenuidade de poeta! Agora vou começar pelo fim.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

sobre os eu-te-amo ditos entre tantas coisas e os eu-te-amo sobre todas as coisas

Hoje eu quase disse. Foi por um clique. Sorte minha o verbo ter declinado, porque os sujeitos estavam na ponta dos dedos. As teclas já estavam digitadas. Era só "puxar o gatilho" e lá iriam minhas impressões... Medo. Não disse porque senti medo.
Lendo sua mensagem... notícias frescas trazidas por uma tempestade de ilusões! Tive de me conter (você sabe que não gosto de guardar, não sou de aguardar) para não sair declarando tudo que vem há tempos sendo represado aqui dentro. Ah, como foi difícil resistir!!! E controlar minhas atitudes tempestivas!
Mas é bom notar que hoje superei o impulso imediato de escrever com todas as letras, em dialetos que só você conhece, com neologismos que inventamos quando compartilhamos sensações inclassificáveis e repletas de rótulos convencionais... e todos os clichês que eu teimo em resgatar e relembrar e usar de novo para me fazer acessível e previsível.
E hoje quase eu disse. Mas me calei porque escrever, ali, na sua caixa de mensagens, a frase "proibida" (sim.. eu me proibi dizer a verdade a você!), podia parecer leviano, podia soar vazio... e eu espero tanto o melhor momento de lhe fazer a minha confissão! Foi por pouco e hoje eu quase disse. Mas... eu preciso dizer sem usar essas mínimas palavras.... porque eu amo você.

"O Eu te amo é uma coisa muito, muito séria e que faz o encontro das pessoas no universo ser significativo. É lindo ser amado, faz bem amar.
A gente passa a vida esperando um eu te amo sincero, e quando ouve... pelos céus Lóry! Desconfia de quê? Se não fosse verdade, se calaria! Você já teria ido embora, e esses meses todos seriam pra quê?"
(de Lilia Reis)

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

rebobine, por favor!

Acordo dentro de um filme. Os movimentos, os passos, a cena. Pela janela escorre um fiapo de felicidade, atravessando o meu mau humor incomum. Reflexos de saudade brilham mais intensamente neste enquadramento desproposital. Você caminha com segurança entre os móveis imóveis da minha sala. Seus gestos confirmam a falta de veracidade dos atos. Estamos um diante do outro. Diante de silêncios e covardias. As palavras perderam a voz na nossa comunicação. Só os olhos falam. Em câmera lenta, você se movimenta. Na minha direção. Lentamente você entra em cena. Dentro do filme, seu papel é secundário. você não se importa em atuar mal. Representa desleixadamente seu papel com superioridade. Deste ângulo, interno, eu atropelo sua inércia desmedida e pratico abusos. As ações suspensas no pensamento congestionam o desenvolvimento do gesto. Eu gesticulo indicando-lhe um caminho, você me percorre.