sábado, 30 de março de 2013

silencio

O silêncio que mora em mim não tem outro  nome. Mudo. O verbo sem conjugação possível para a sua pessoa. Mudo. Calo o amor que implode por dentro e impede que meu organismo funcione plena mente. Um corpo inerte traduzido em braile. Mudo. Tudo o que gira sobre mim tangencia um desejo reprimido de amar a sua palavra. Gestos imprecisos contornam a sintaxe perfeita de um discurso em desconstrução permanente. Eu sou a mulher que engole os neologismos que você inventa para amenizar a concretude dos meus substantivos amargos e ácidos. Você discorre. Você diz: "Corre!". E eu permaneço. Absorta e diluída. Me liquefaço em rimas aparentemente profundas e naufrago nos vocábulos interrompidos que você dispara quando me diz: "Para!". Eu não digo. Eu não paro. Não ando. Não corro. Morro. Mudo meu verso. Meu verso mudo. Falo. No meu verso sempre falo (de você).

domingo, 17 de março de 2013

notas avulsas

Acordo com seu nome. Na minha boca você tem gosto inconfundível. O prazer, o gozo, o desejo. Tudo tem o mesmo gosto que o seu nome na minha boca quando acordo. E suas palavras ressoam pelos cantos da casa. No quarto, as paredes recendem a gozo. Reacendem o gosto. Impregnadas. Na cama em que você depositou as últimas gotas de um gozo infinitamente pleno reverbera o silêncio contundente do seu corpo. Sempre achei "engraçado" seu jeito silencioso de gozar, contrastando com meu gemido ensurdece-dor. E hoje acordar com você na cabeça, feito ideia fixa, foi qualquer coisa... algo assim como perturbador.
Na mesa do café da manhã seus passos rondando os espaços e rituais que você nunca frequentou. Hábitos solitários que nunca pluralizamos por sabermos dos riscos. Intimidade em excesso poderia nos tornar mais distantes. Viro o líquido da xícara como quem está a sorver uma dose de veneno. Amargo. Degusto sua ausência à mesa sentindo um incontrolável esvaziamento do corpo. Não me lembro de ter sentido sua falta ali de forma tão insistente.
A imagem irrefletida no espelho destoa da cena.
Fujo para o meu refúgio mais seguro: o trabalho. Me escondo entre as linhas que algum autor desavisado deixou para eu revisar. Eles (esses autores outros) não sabem que você é minha melhor inspiração. Eles gastam os dedos no teclado para me dar mais trabalho. Escrevem suas fórmulas e equações, regras e muletas textuais sem usar a artéria mais preciosa a um escritor (de verdade). Eles escrevem, sem carregar a verve.
E é por isso que eu deixo o trabalho de lado e paro para ler você. Suas palavras parecem vir da minha boca! Sua narrativa permeia meus sentidos como quem rabisca garatujas incompreensíveis. Seus verbos me excitam a língua e eu salivo seus poemas como se estivesse a balbuciar... Às vezes seu sujeito fala em primeira pessoa e eu o leio como vocativo. Um chamamento.
Coincidência ou não, ontem li dois textos que me remetiam a você... e eu me permiti viajar na possibilidade de escrever para você contando meus desejos reais. Minhas aspirações ensandecidas e minhas (ins)pirações recorrentes.
Vários filmes me vêm à mente. Penso na trilha sonora: "gosto do seu gosto musical". Concluo: eu gosto do seu gosto visceral.
Agora tudo faz sentido.
Tudo é sentido.