domingo, 20 de novembro de 2011

para os dias azuis

Respirar a sua presença, apesar de você não estar, mas ser em mim e do meu lado (de dentro). às vezes é preciso apenas respirar. As palavras dançam uma música constante e silenciosa, se embaraçam em nós. Palavras são volúveis demais para o meu amor perene e longínquo. você está em todos os rastros, em todos os passos, você está em cada verbo que calo. Conjugo meus pensamentos no seu imperativo modo. Oculto sujeito.
Verso sobre versos que não fiz... Tudo brilha em mim se é você.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

tato

Na extremidade distante. A sutileza do tato sem contato. A pele é órgão sem sentido quando suas digitais se ausentam dos meus poros... e eu decoro a falta do seu toque sobre mim com a lembrança recente do seu calor – chama que me chama quando você queima no interior de mim. Um abraço que permanece latente aproxima sua ausência e eu não sinto mais nada.

sábado, 6 de agosto de 2011

Amalgamando

Feito a poesia, ele entrou no meu discurso. Seu poema enxuto e cortante. O silêncio triste do homem se expondo, exatamente porque ele se esconde em cada verso e só nas entrelinhas se percebe sua delicadeza. Sua metáfora rude. Sua falta de estilo ao dizer coisas tão doídas me confundindo. Minha forma mínima cabe tão bem e também cai em seus haicais. A poesia se misturando em nós. Paixão. Suas letras foram se imprimindo na minha escrita... As mãos exprimindo gestos tão intensos que me escapavam à inspiração. Fomos ficando verso e poesia. Rima e poema.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Ao meio-dia

O relógio marcava meio-dia. Na minha consciência esse era o melhor horário para dizer coisas sem nexo. Escrever todas as cartas que jamais postaria. O tempo. A linha efêmera do cartão-postal.

Eu tenho apenas algumas linhas pra contar a ele que, agora que vejo um mundo palpável em minha frente, posso gostar de janelas. Talvez ele também quisesse conhecer essas quedas-d’água... essas flores... a vida desenhada em forma de arco-íris...

Na parede mais distante a constatação de que ao meio-dia as possibilidades são absolutamente imperfeitas, mas reais. Apesar disso, todas as minhas lembranças não caberiam nas escassas linhas do cartão que eu escolhi para lhe mostrar que esse lugar onde ele não pode entrar é encantador.

Aqui o tempo é estático. E a felicidade dura pra sempre, pois é meio-dia há horas.

Meio-dia: mais de meia vida perdida entre um tique-taque e outro. Mas os ponteiros estão unidos. Um sobre o outro... E eu estou tentando dizer que nossos ponteiros não se tocam em tempo algum. Estiveram sempre descompassados. Anti-horários sentidos.

Percebo que não há nada a dizer-lhe depois de vivermos juntos. Ao meio-dia é possível dizer essas incoerências sem restrições legais. À luz do Sol não há contestação.

Fosse na calada da meia-noite e ele já estaria gritando: “Isso que você está dizendo não passa de uma grande bobagem. Você me ama e não quer que eu vá embora coisa nenhuma.” Mas ao meio-dia ele não pode gritar porque ninguém vai ouvir.

... Pensei em ir à cozinha fazer um café. Era meio-dia e eu não sabia o que dizer para ele. As sensações roendo o pensamento. Por dentro, apenas pulsavam as horas que não voltam para desfazer o estrago.

A enfermeira me pôs um comprimido sob a língua na tentativa de ajudar o silêncio a não me despertar. O soro no fim da veia... o pulso: era hora de trocar o curativo: meio-dia.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

silêncios

Ontem, véspera de Santo Antônio, eu ouvi o canto de um silêncio monstruoso que feriu e ainda dói muito no peito daquele homem...

O homem é comum, não me aproximo de homens que assim não se revelem, mas se classifica como alguém "não comum e nada convencional". Rotula-se "não tributável".

Ontem, depois de horas discorrendo sobre qualquer assunto que não implicasse intimidade, de repente, ele calou. E cantou... silenciosamente ... uma canção de desespero e tristeza que não tinha mais tom... desafinou... perdeu a voz dentro do seu silêncio (ab)surdo.

Tomou uma xícara de café forte, que até hoje não sei se ele gosta ou se pede e bebe sem reclamar por educação e gentileza.

Depois, com a mesma expressão que se vê no rosto de um homem feliz , ele me contou que fora expulso de casa pelo pai aos quinze ou dezesseis anos. Por causa de uma dona que o pai imaginou estar de coisa com ele. Motivo torpe? Claro, mas quem se importa com motivos? Na rua, apenas com suas poucas peças de roupa, sem dinheiro, sem nada.

Olhei bem para o seu rosto naquele momento e posso garantir que ele não demonstrava nenhum rancor, nenhuma raiva. Não vi o menor sinal de revolta em sua face meiga e branda.

Ao contrário, seu semblante irradiava uma luz quase ofuscante de tanta serenidade, de tanta doçura.

E, depois de relatar sua história, ele sorriu.

Não pude compreender sua dor. Sou da linhagem dos que tiveram uma infância feliz, em família, com direito a escola, comida, brinquedos caros, roupas... tudo que uma criança pode querer para chegar à adolescência e se rebelar. O homem nunca vai poder saber o que é isso.

E o silêncio que aquele homem cantou para mim ontem está remexendo aqui dentro. Primeiro senti uma forte dor de cabeça, como se ao pensar nele meus neurônios se inflamassem. Depois veio o aperto no peito (lugar comum para a situação insólita!). Mais tarde, quando ele foi embora sem me abraçar, sem me desejar boa-noite, sem olhar nos meus olhos, doía tudo, parecia que eu havia ingerido uma dose de um nada digerível veneno (coisa da minha alucinação, eu sei... nunca bebi veneno para associar a sensação ao entorpecimento que me tomava). Então finalmente eu gritei para não morrer sufocada com o silêncio que ele deixou em mim.

terça-feira, 31 de maio de 2011

(des)encontro

Sempre gostei de histórias de amor. Das que acabam bem, das que acabam mal, das que acabam. (Acho que todas têm seu jeito próprio de acabar!)
Gosto de histórias de amor com flores, perfume, surpresa e pressa... que acontecem devagar e fazem divagar...
Gosto de escrever sobre (des)amores e sobre amores impossíveis de acontecer. Gosto de escrever de mim sobre “você”, a nosso respeito... gosto de dizer minúcias e detalhes impublicáveis para ninguém ler.
Gosto de ler as histórias de amor que ainda e sempre serão escritas. Gosto dos verbos deslocados entre sujeitos dispersos e diversos... sujeitos que fogem de versos e vão conjugar sua pessoa em outros tempos e modos inexistentes. Metalinguagem. Gosto de linguagem metafórica no mais real dos contos de fadas, maravilhosos e fantasticamente incontáveis na prosa linear dos romances que nunca serão escritos.
Gosto. Gosto de histórias. Gosto de histórias de amor.
(e por isso gostei do seu conto!)

sábado, 28 de maio de 2011

porta entreaberta

Quando ele saiu da minha vida, eu não imaginava: Quanta dor. Saudade. Falta. O beijo que não vinha e a boca seca lembrando a perfeição do desejo e o acaso das impossibilidades.
Quando ele saiu, sem reverência, da minha casa, pedindo compreensão e distanciamento... causando feridas nas paredes do meu pensamento ingênuo (que acreditava não ser pra sempre o adeus)... rasgando os tecidos da minha sanidade e lucidez...
Quando ele se foi, por fim, pondo fim ao que estava acabado há tempo, por falta de tempo pra nós... ele esqueceu de fechar o ciclo, deixando uma fresta teimosa entre nossas necessidades... um hiato... uma palavra acenando diversas interpretações e a porta entreaberta pra você entrar.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

sobre a urgência de 3 minutos

Somos humanos e temos todo o tempo do mundo. Temos tempo para dizer as frases mais desconexas que nos vêm à mente. Enquanto o relógio marca o tique-taque das horas, pacientemente a urgência de ter você por perto lateja todos os minutos da minha imprecisão.
Minha noção de saudade tem a força das catástrofes e me remove da cotidiana falta que você me faz...
Lendo seus versos, eu me recomponho, me refaço,
marco outro ponto pro nosso próximo encontro
e desencontro...
Seu poema (três)loucado em minutos de espanto remete tudo a três, quase por um triz... a “dízima periódica” que compus aos quinze anos me traz ao três outra vez: e o que é que você me diz?
Passei horas escrevendo sobre os minutos que não temos - ironia atemporal da vida que me castiga. Mantenho-me incondicionalmente paralisada, inerte, imóvel, estática e morna à espera do seu breve prazo de validade vencer. Registro minhas incoerências verbais abomináveis sem me deixar levar pela censura da poeta que hiberna na ausência do ritmo e da rima...
Quanto tempo você levará para me ler?!

domingo, 15 de maio de 2011

matinal

Acordo com a boca impregnada do seu gosto. O gozo quente reverbera entre os dentes. A fome disfarça uma saciedade inatingível. Toda atmosfera exala seu perfume. Penso que ainda estou adormecida. Entorpecida, realizo os hábitos dessa manhã que começa sorridente dentro de mim. Sou o que fui pra você na noite passada... que ainda não passou... e, desperta, me faz feliz!

sábado, 23 de abril de 2011

basti-dores

(primeiro ato)
sorrateiramente, sua mão se distancia e não toca mais meus sonhos. pleno de argumentos vazios, seu olhar escapa da mira que alvejo: meu desejo. pacientemente você desconstrói - tijolo a tijolo - o alicerce frágil e utópico que erguemos. não sinto seu cheiro exalando dos meus poros e esconderijos.

(defecho)
Ao acordar, não dirijo a palavra a ninguém. Só me resta escrever essas emoções despedaçadas que restam, me arrastam... pro abismo. E eu cismo que você lerá estas linhas! Por isso, antes de assinar embaixo, ergo a cabeça e confesso: eu não sou essa doçura que você provou. Meu fel escorre entre o verbo e a rima... depois contamina sua poesia verborrágica e instantânea. Eu falo isso pra você não pensar que quis enganar. ...Foi melhor você ter ido antes de experimentar meu veneno

terça-feira, 12 de abril de 2011

sobre os atrasos

Quem nunca teve um amor que demorou a chegar que atire a primeira estrela! Amores sempre chegam fora do tempo. Atemporais e nos temporais de ilusão, medos, indecisões... Amores quando vêm são inescrupulosos e tardios, nunca se antecipam; não acontecem no calor vívido da esperança... "amor chega tarde" (será que é isso que disse Drummond?)

segunda-feira, 7 de março de 2011

blecaute criativo

Diante do computador, deixo-me ficar inerte e compulsivamente à espera de algo. Não sei bem se o que me move é essa inércia incontrolável ou um suposto controle imóvel que me paralisa. Contradições à parte, não saio da frente da tela com a impressão de que ao sair algo extremamente importante irá acontecer. Os arquivos que não abro para trabalhar. As pesquisas que deixo de realizar. Tudo é motivo para praticar a morbidez da espera virtualmente acessível e intocável. Virtualidades inexplicavelmente reais. Imagino você ao alcance das minhas mãos. Penso em seu corpo. Pele macia, toque caloroso. Beijo. Sua boca passa entre os emails que não leio. Língua morna em sua sede plena. Desconcentrada, não respondo aos contratos. Incorrespondência acumulada nas caixas postais. Mensagens inúteis lotam minha insensatez. Eu deleto. Remetentes desconhecidos, spams. Mensagens religiosas não prometem mais do que entretenimento. Só a falta de energia elétrica acaba com essa rotina doentia.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

olhar

Basta abrir as pálpebras. Só tenho olhos para você! E como minha visão (míope por opção) não enxerga seu corpo à distância, vejo você bem de perto, quase dentro de mim. E assim observo sua forma e seus contornos distorcidos quando você se afasta, por instantes, do entorno. Mas é só fechar os olhos novamente para que eu contemple mais uma vez a sua proximidade tênue aqui. Exploramos esse momento terno, quase eterno, enquanto a sua doçura agreste visita a menina dos meus olhos – retina desgastada por uma saudade bem singular.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

ex(er)citando...

Eu queria saber só mais um pouco disso tudo. Da vida que arrasta desejos pra dentro do peito e depois transborda ausências contínuas. Queria saber da “nossa” festa efêmera. Brincadeiras libidinosas no quarto desarrumado. Desarrumada. Sinto-me desarrumada. Desorganizada, mas destemida. E claro disléxica... As palavras dançam na minha cabeça, e quando quero pô-las no papel, na tela, não sei mais que palavra era o que eu ia dizer... não sei mais escrever. Desescrita sou descrita assim: eu, que era tão boa na sintaxe justa dos conectores e subjuntivos, vejo-me inexpressivamente confusa com as regências, os modos e os tempos... (só para os verbos há tempos plurais, que constatação mais triste!) Eu queria saber mais de esperas, menos de saudades e abstinências... Eu queria saber mais ou menos de você.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

sufoco

detesto os dias brancos de você. dias sem sorrisos. eu detesto dias sem verso ligeiro. detesto o dia inteiro pela metade. dia de inverno frio ardendo verão em saudade e ausência. eu detesto. detesto escrever em vazios sem-sentidos. detesto o que não é dito. o que está inescrito nas entrelinhas sem subterfúgios. detesto silêncios na tarde. tarde de espera. detesto que você tarde. eu detesto.

domingo, 9 de janeiro de 2011

"na primeira manhã que te perdi"*

Estranhei o costume rotineiro de acordar sozinha. Como se a sensação desconfortante de solidão fosse tão distante que não cabia mais nas manhãs de domingo. O sonho nitidamente interrompido antes do fim. O travesseiro imóvel. A janela. Escuro. Era muito cedo pra me levantar num domingo. A cama, repassando cada cena daquela história, amortecia o vazio do quarto. Pensei em você. Seu cheiro nutrindo lembranças mornas... Seu corpo exalando a permanência na minha pele. Suas mãos folheando meus instantes de lucidez. O gosto brotando, a intocável suavidade deslizando entre os lábios. Sua voz decifrando a melodia dissonante das minhas manhãs solitárias. Num intervalo constante e profundo. Silêncio. Pensei em você. Seus olhos contando doçuras e mistérios, enquanto meus segredos atravessavam seu olhar. Não vi arrependimento, nem culpa... mas o perdão fora concedido quando eu inadvertidamente cedi e me entreguei a você.

* Da música de Alceu Valença